Brasil em Encruzilhada: Reindustrialização ou Manutenção do Modelo Econômico
- Daniel Luis Silva
- 12 de abr.
- 3 min de leitura

Introdução
As últimas décadas testemunharam um fenômeno marcante nas economias ocidentais: a aposta radical na globalização neoliberal. Estados Unidos e Europa, em nome da eficiência de mercado, transferiram grande parte de suas cadeias produtivas para o Leste Asiático, em busca de mão de obra mais barata. O que parecia ser uma vitória do livre mercado acabou por alimentar a ascensão de potências como a China, que souberam utilizar o impulso da industrialização externa para fortalecer seus próprios projetos nacionais. O Brasil, por sua vez, assistiu a esse processo de fora, mantendo-se preso a um modelo primário-exportador. À medida que os ventos da economia global mudam novamente, o país se vê diante de uma escolha decisiva: reindustrializar-se com base em inovação e estratégia ou permanecer no modelo atual e absorver os excedentes industriais das potências globais.
Os Riscos da Guerra Comercial entre EUA e China para o Brasil
A reindustrialização em curso nos Estados Unidos, impulsionada pela rivalidade com a China, levanta uma questão delicada: onde será realocada a produção que eventualmente o Leste Asiático deixar de fornecer ao mercado americano? Diante disso, o Brasil corre o risco de se tornar um dos destinatários desse excedente industrial, sem qualquer benefício duradouro em termos de estrutura produtiva ou autonomia tecnológica para nosso país. Esse cenário evidencia a urgência de um plano nacional de desenvolvimento baseado na reindustrialização estratégica. Não basta esperar que o mercado resolva os desequilíbrios. É necessário agir com clareza, urgência e coragem para transformar a estrutura produtiva do país.
O Papel do Estado: Inovar para Criar Mercados
Como bem argumenta a economista Mariana Mazzucato, o Estado deve atuar como criador de mercados — não apenas como regulador ou financiador. Ele precisa assumir riscos que o setor privado, limitado pelo curto prazo, não está disposto a encarar. A inovação real, aquela que transforma sociedades, exige enfrentamento da incerteza (ou seja, a ausência de qualquer certeza) — e é aí que o Estado pode e deve liderar.
Exemplos históricos são abundantes: da corrida das grandes navegações, iniciada no século XV, ao desenvolvimento da internet no século XX, o poder público foi o motor inicial das inovações que moldaram o mundo moderno. No Brasil, essa consciência ainda é frágil, e muitas vezes sufocada por discursos ideológicos que opõem Estado e mercado como se fossem rivais. A verdadeira inovação nasce da cooperação: universidades, empresas e governo atuando em conjunto em prol de metas claras. Isso exige abandonar o paradigma atual e reconhecer que necessitamos da coordenação estatal, para que o desenvolvimento econômico e aumento de poder de compra dos brasileiros seja uma realidade no longo prazo.
O Foco no Desenvolvimento de um Sistema Nacional de Inovação Integrado
Uma possibilidade estratégica para o Brasil seria a criação de um sistema nacional de inovação robusto e duradouro, estruturado como uma política de Estado, independentemente dos ciclos políticos. A ideia seria que esse sistema integrasse agentes públicos e privados em torno de missões nacionais estratégicas, conectando a pesquisa fundamental às aplicações práticas na indústria.
O estímulo à criação de consórcios estratégicos, que uniriam universidades públicas de referência, centros tecnológicos como o SENAI e outros braços da Confederação Nacional da Indústria (CNI), grandes empresas de setores chave e start-ups, garantiria as bases para o desenvolvimento desse sistema de inovação. Essa colaboração proporcionaria uma troca valiosa de conhecimentos e recursos, promovendo sinergias que acelerariam a inovação e a transferência de tecnologia para o setor produtivo.
Claro que, para garantir que essa roda girasse, seria fundamental garantir orçamentos estáveis e sustentáveis, além de definição de metas claras, acompanhadas de indicadores mensuráveis, contribuindo para o sucesso a longo prazo.
A ideia seria complementada pela adoção de políticas públicas que utilizem as compras governamentais como instrumento para retroalimentar e impulsionar o modelo, criando um mercado robusto para novos produtos e tecnologias. Assim, o governo não só estimularia a inovação no setor privado, mas também contribuiria para a construção de um ecossistema industrial mais competitivo. Superar essas barreiras poderia ser um passo importante para evitar que o Brasil continue promovendo "ilhas de excelência" que, embora notáveis, não geram impactos estruturais e duradouros na economia.
Conclusão
O Brasil encontra-se novamente diante de uma encruzilhada histórica. A escolha é clara: ou nos organizamos para uma reindustrialização estratégica e sustentável, ou devemos nos resignar à manutenção do modelo de livre mercado, que não tem possibilitado resultados positivos para aqueles países pobres ou de renda média que o têm adotado nos últimos 30 anos.
Daniel Luís da Silva.
Bacharel e Mestre em Engenharia, Graduando em Economia, atuando há mais de 20 anos como gestor de Projetos na Área de Óleo & Gás.
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